O filme “Extraordinário” (EUA, 2017) conta a história de Auggie Pullman: um garoto que nasceu com deformidade facial (submeteu-se a 27 cirurgias plásticas) e se prepara, aos 10 anos de idade, para frequentar a escola regular pela primeira vez. Stephen Chbosky (mesmo diretor de “As vantagens de ser invisível”) retrata no filme não apenas a dificuldade de convivermos com o diferente; mas também nossa projeção, para o bem ou para o mal, sobre ele.
A inovação também é o diferente, e nosso sucesso depende da maneira como tratamos o novo. Tendemos a transitar nos extremos, mas dificilmente agir de modo natural com aquilo que nos tira da zona de conforto. Criamos, em nossas empresas e casas, mecanismos para endireitar os ‘fora da curva’, ignorando o que o filme também mostra: ganha quem se aproxima, e perde quem se afasta, ou tenta agredir, aquele que é diferente.
Se subirmos alguns degraus, ganharemos visão panorâmica para notar que existem grupos inteiros de pessoas consideradas ‘diferentes’; e um mundo armado de preconceitos com o propósito equivocado de “curar o que está disforme”: não é de hoje que regimes são erguidos sobre o isopor de supostos inimigos, em cima dos quais projetamos nossa brutal mediocridade e nossa infelicidade por não ter coragem de simplesmente investir numa escolha que cresce de dentro, ou assumir uma condição.
Quando a mãe de um dos colegas de Auggie confessa ter sido ela quem o removeu, com Photoshop, da foto oficial da turma — não queria que amigos da família o vissem —, ela meramente reproduz, ou pior, veste o filho com a armadura de um dos gritos mais tristes do mundo: volte para o lugar de onde veio! Como se, em exemplo alusivo, a indústria fonográfica pudesse mandar os dois Steves de volta àquela garagem em Los Altos, Califórnia.
Mesmo a estatística e a história nos mostrando que os locais mais inovadores do mundo são justamente aqueles que co-criam com o caldeirão cultural das minorias — os que abraçaram a criatividade de povos expulsos de países e continentes —insistimos em pensar que criar nossa felicidade tem qualquer relação com provocar infelicidade no outro. Quando o contrário, felizmente, é bem mais lógico.