Nosso negócio não vai acabar hoje

Mas isso não quer dizer que nossa empresa talvez não desapareça amanhã. Em tempos de transformações radicais, é possível que isso aconteça. Só que é um desperdício ensinar a singularidade unicamente pelo quadro negro da ameaça.

Nada errado em vasculhar estatísticas, indústrias despachadas como farelo de pão, mas é difícil colher criatividade se plantamos um clima desnecessariamente aterrorizador: passar o tempo inteiro lembrando nossos colaboradores de que amanhã podemos não estar mais aqui tem o mesmo efeito que desejar que nossas crianças aprendam sem diversão, pela armadura da palmatória e do castigo.

Pior ainda é querer que nossas equipes encontrem soluções mágicas, especialmente neste contexto pantanoso. No livro “Ascensão e Queda do Planejamento Estratégico”, o estrategista canadense Henry Mintzberg nos lembra que os imperativos “seja inovador” ou “pense com audácia” afastam a criatividade para uma ilha de isolamento: colocar os gerentes em volta de uma mesa com o briefing repentino de pensar disrupção é uma das melhores maneiras de justamente suprimir isso.

Somos a geração que pensa demais, que tenta entender demais e depois perde tempo de execução explicando o que os jovens estão apenas vivendo. Devemos aprender com nossos filhos, apreender como usam a tecnologia, o que elogiam, do que reclamam: a Apple todo ano convida pré-adolescentes para participar de sua World Developers Conference, na Califórnia; a Ford conduz pesquisas com crianças de cinco anos de idade: ambas acreditam no papel da inovação incremental como protagonista da criação de um futuro diante do qual muitos de nós ainda nos colocamos como meros espectadores. Um futuro que, como bem diz Yuval Harari, pode ser apenas uma sugestão. 

Enquanto nos recusarmos a conviver de modo menos afetado com a incerteza, e buscarmos garantias de que nosso negócio se tornará exponencial antes mesmo de fundarmos a base, incorreremos no erro clássico de pensar que transferir nossa angústia por ameaça não tem o mesmo efeito de que passar, a um concorrente que ainda nem conhecemos, um cheque ao portador. Isso se a indústria de cheques já não tiver sido reinventada.